Canto Súbito de Hermes
Somos quatro desde quando o dia subitamente surgiu na janela. Ergueu-se o sol, tramando etapas, fulgurando teu rosto de vidas. Não disse por que veio, nem onde iria te levar a luz dos seus rumos. Tua sombra pairou com receio, mas tu seguiu confiante. Tua fronte ergueu-se ao sol, dedicando-lhe os olhos. No trem que passava ao teu redor, lá fizeram-se a minha sombra e mordaça. Pelas grades das janelas dos vagões, um intervalo de luz e breu golpeava um enigma no teu peito. E teu rumo foi andar e andar. O sol iluminou rastros e pedras, passagens e lembranças. Mas tu quedou-te na linha negra de outra sombra, que não era tua. Naquela hora, não houve dor, não houve medo. Mas a estrada tranquila guarda sempre um desfiladeiro. A paisagem do mundo se desvanece aos meus olhos, quando do trem não cega-me o sol, pensei. Então ainda éramos quatro, as sombras estavam ali. Porém, ao meio-dia, enquanto o sol te flambava, já era um fantasma sem segredo o que te fizera cega e atônita: não havia vagões no trem, não havia mais a tua própria sombra. Teu peito rompeu-se e meus olhos se abriram em milhões de paisagens perdidas.
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